Rede e computação estão tão conectadas que a regulamentação delas deve ser conjunta

“Avaliação acerca de se a Web 3.0 irá afetar o ambiente técnico de tal forma que justifique alterações regulamentares para incorporação desses elementos no acompanhamento competitivo desenvolvido pela Agência (pois ainda não se tem uma visão clara da necessidade de regular, do ponto de vista mais assertivo, os termos de competição acerca do objeto trazido na questão acima). Considerando que é impossível atualmente se dissociar tais tecnologias (rede e computação), seria possível separar sua regulamentação ou ela terá de ser conjunta?”
@ Luis Cláudio Santoro / SCP
@ Moisés Gonçalves / SCP

Dada a tendência de convergência tecnológica e as práticas regulatórias observadas em diferentes jurisdições, parece que a regulamentação de redes e computação está se tornando cada vez mais integrada. A separação dessas áreas pode se tornar impraticável ou ineficiente, pois as tecnologias estão cada vez mais interligadas e as fronteiras entre elas estão se tornando menos distintas. A regulamentação conjunta pode ser necessária para abordar adequadamente os desafios e oportunidades apresentados pela convergência tecnológica. (vide 2.1.1. Estrutura regulatória europeia).

A título de exemplo, uma abordagem regulatória conjunta pode ser mais eficiente para tratar questões com abrangência sobre múltiplas áreas, como segurança cibernética, qualidade de serviço e proteção ao consumidor, especialmente quando as funções de rede e computação são interligadas em muitas aplicações da Web 3.0. Algumas normas que já demonstram essa interface, no âmbito europeu, são atinentes às seguintes áreas:

  1. Proteção de Dados e Privacidade: O GDPR impõe regras sobre a coleta, armazenamento e processamento de dados pessoais, o que afeta tanto os serviços de computação (como servidores e nuvens) quanto a infraestrutura de rede usada para transmitir esses dados.
  2. Segurança de Rede: A Diretiva NIS foca em melhorar a segurança geral das redes e sistemas de informação críticos na UE. Embora seja mais orientada para a segurança da rede, a implementação efetiva também depende da segurança das plataformas e sistemas de computação que gerenciam e processam dados.
  3. Regulamentações Específicas de Serviços Digitais: O Digital Services Act (DSA) e o Digital Markets Act (DMA), propostos pela Comissão Europeia, são exemplos de como a UE está abordando questões relativas à regulamentação de serviços digitais que englobam tanto aspectos de rede quanto de computação.

Como o DSA foca na regulamentação das plataformas digitais para garantir a segurança dos usuários online e a transparência dos serviços oferecidos, é natural que esteja mais voltado à camada de computação. Por exemplo, é responsável por estabelecer regras sobre moderação de conteúdo, transparência de dados, formas de publicidade e proteção ao usuário. Com isso, é viável sua implementação por meio de uma Autoridade Digital de Coordenação, responsável por acompanhar o assunto nacionalmente, mas sempre em colaboração com a Comissão Europeia.

Como o DMA tem ênfase em controlar o poder de mercado das grandes plataformas, conhecidas como “gatekeepers”, está mais próximo das questões atinentes à rede. Mas, sem prejuízo, não podemos deixar de ter em mente que o bem jurídico tutelado é a concorrência, não se tratando propriamente de regulamentação da rede em si. Em contraste com o DSA, a Comissão Europeia é a autoridade central direta, muito mais independente das autoridades nacionais para fazer cumprir as regras e impor sanções em caso de desconformidade.